Deslocamento de perspectiva
A Chef carioca Rebecca Lockwood age no limiar do espaço dito da Arte e do espaço do quotidiano, este último definido por uma infinidade de elementos do Real, invisibilizados por sua banalidade, pela sua obviedade. O seu quadro de ação está definido pelos numerosos rituais de convivência que conformam o padrão internacional de serviço gastronômico. Ela desvia certos elementos do ritual, criando um extranhamento que torna visível aquilo que já há muito escapou, por hábito, ao âmbito do visível.
Rituais de convivência e estratégias de integração
É difícil classificar o que Rebecca faz. Vem sendo chamado de performance gastronômica, o que ao mesmo tempo é amplo demais e redutor. No ato inaugural da exposição 2em1, ela produz um coquetel que contem todas as características padrão de uma abertura de exposição ou de um evento de celebração. Porém, ela altera certos fatores. Já na exposição Associados, em 2007, Rebecca produziu a Sopa da Pedra, onde ela trouxe uma panela e uma pedra, convocando todos os participantes e visitantes a trazer ingredientes. Na ocasião do 2em1 ela trabalhou em estreita colaboração com a ANAERJ, a Associação de Nanismo do Estado do Rio de Janeiro e desenvolveu um conceito de coquetel onde o bar seria montado nas dimensões apropriadas para os membros da associação, de modo que os convives grandes teriam que se adequar aos barwomen e barmen anões. Sendo a integração um elemento fundamental da convivência, essa operação, que desvia o esperado pelo público, criou um ambiente e uma situação que transcendeu de longe o significado comum de um coquetel de inauguração, revelando preconceitos e a falta de convívio com a diferença no seio de nossa sociedade. Ao longo do evento, os convidados foram se acostumando ao tamanho, para eles inusitado, dos anfitriões. Rapidamente o ambiente ficou descontraído e a normalidade se estabeleceu. Todos (incluindo os pequenos amigos de Rebecca) com certeza saíram mais ricos de uma experiência, e com um mundo mais amplo, mais aberto e mais feliz. O ritual de convivência se torna uma experiência de vida e uma estratégia de integração.
Roberto Cabot
Rio de Janeiro, 02/08/2009
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